quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

"Alguns padres não são feitos para uma vida celibatária" Entrevista com Ir. Brigitte Thalhammer


Brigitte Thalhammer não é uma freira dos livros ilustrados infantis. Ela não usa um hábito religioso com o famoso véu, mas práticas calças de linho prático e uma camiseta cinza. Sobre a sua mesa, vemos discurso inédito de Jean Ziegler [ex-professor de sociologia da Universidade de Genebra], que ele pronunciaria no Festival de Salzburgo. A religiosa da Congregação das Irmãs do Divino Salvador, nos mostra o seu quarto dizendo: "Eis a minha cela".

A reportagem é de Katrin Burgstaller e Rosa Winkler-Hermanden, publicada no sítio Derstandard.at, 30-11-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ela encontra muitos estímulos na Pfarrer-Initiative. Ela também considera repugnantes alguns desdobramentos na Igreja Católica. "São coisas que me incomodam muito", diz Thalhammer. Ela não entende o fato de ser negado às mulheres na Igreja Católica o acesso ao ministério ordenado afirmando-se que "assim foi estabelecido pelo Senhor Jesus". Nesta entrevista, ela explica por que não considera necessário o celibato para os padres, mas rejeita para as religiosas "relações sexuais com um homem ou uma mulher".

Brigitte Thalhammer, nascida em 1965, em Bad Ischl, entrou na Congregação das Irmãs do Divino Salvador em 1996. É conselheira administrativa do hospital St. Josefspital, em Hietzing, Viena. Estudou economia empresarial e depois trabalhou em uma agência de viagens. Sua vida religiosa começou com o compromisso em uma paróquia. Como superiora provincial, leva "a responsabilidade geral por tudo ", que vai da atenção a cada irmã individual à responsabilidade por todos os problemas de direção e de finanças.


Eis a entrevista.

Há falta de padres. Há também falta de freiras?

Sim, é claro. Embora a palavra "freira" [monja] diga respeito apenas às chamadas comunidades monásticas, isto é, aquelas congregações cujos membros levam a sua vida na clausura do mosteiro. Mas também temos uma falta de religiosas.

Por que existe essa falta?

Há muitas razões. Uma delas é que a imagem que as pessoas têm da vida religiosa é muitas vezes bastante estranha. Não consegue transmitir a ideia de que ela pode ser uma forma de vida. Muitas também se perguntam por que devem fazer parte dessa Igreja que se torna cada vez mais problemática. E, enfim, a questão Deus também não é mais tão evidente. No fundo, estão em crise todos os vínculos que comprometem para toda a vida, inclusive o casamento. Muitos não querem se decidir a entrar na incerteza de uma vida por toda a vida.

Quantas jovens entram anualmente na sua congregação?

Seria bom se todos os anos viesse uma. Mas não é assim. Atualmente, há duas irmãs no noviciado, ou seja, o tempo antes da profissão definitiva.

Por que na nossa sociedade em geral as pessoas querem menos vínculos?

Há muitas possibilidades de escolha. Antes, tudo era previsto de uma maneira mais rígida e precisa. Essa mudança radical se estende a todos os âmbitos da vida: ao trabalho, ao lugar de residência, ao companheiro ou companheira de vida. A questão é: como pode permanecer coerente uma decisão de vida em uma sociedade plural em contínua transformação?

Quando a última religiosa entrou na sua congregação?

Nos últimos cinco anos, houve duas aspirantes. Uma foi embora por sua própria vontade. Para a outra, nós dissemos que não conseguíamos imaginá-la como religiosa...
que condições é preciso responder para poder viver com vocês?

A primeira é um desejo ardente de Deus e da vida. Depois, há as diretrizes do Direito Canônico: por exemplo, não deve ser casada. E uma coisa importante é que aquelas que querem vir até nós devem ter vivido antes de forma autônoma, sozinha.
Quem não sabe viver sozinha não sabe entrar em relação. Isso vale para as relações a dois, mas também para as comunidades religiosas. É preciso ser capaz de viver em uma comunidade com coirmãs que não escolhemos e que também são muito diferentes.

O que devem compartilhar na vida cotidiana?

Pode-se imaginar, à primeira vista, como uma comunidade residencial. Compartilhamos coisas práticas como a cozinha, o banheiro, o carro e também vivemos em comunhão de bens. Fundamental é o centro comum, que para nós é Jesus, o salvador, o redentor. A partir dessa relação com Deus, organizamos a nossa vida pessoal e a nossa vida comum.

Você disse que há cada vez menos irmãs...

Eu prefiro a expressão "mulheres religiosas", senão pensamos na nossa irmã mais nova... Há muito tempo já não pensamos que as irmãs são mulheres.

Pois bem. Então, você disse que há cada vez menos religiosas, porque a pergunta que surge é se podemos seguir em frente com essa Igreja. Falemos da Iniciativa da Desobediência. O que pode ser apreendido a partir dela?

Para mim é emocionante como essa palavra "desobediência" teve sucesso. Os pedidos que são expressos, de fato, são velhos. São repetidamente repropostos e, evidentemente, por um bom motivo. Já existem soluções para divorciados em segunda união, para padres que têm uma família. Essas soluções são apresentadas pela Igreja de maneira não oficial, mas são contrárias à orientação de fundo. Eu entendo que não se queira romper as defesas. Mas não é pedir muito das pessoas o fato de ter que expressar na indissolubilidade do casamento a indissolubilidade e a natureza absoluta da relação de Deus conosco, seres humanos? Não entendo por que a Igreja, no caso de uma separação, não pode dizer oficialmente que a misericórdia de Deus é ainda maior.

Você também foi assistente de pastoral. Para você, é um desejo que você e outras mulheres possam receber a ordenação sacerdotal?

Sim, Se se dissesse que a rejeição das mulheres como sacerdotisas está fundamentada no fato de que é difícil romper com uma longa tradição, então eu poderia aceitar! Se fosse essa a motivação, eu diria, então, que devemos começar a ver como podemos nos mover para que as coisas possam mudar. Mas se me é dito: "Assim foi instituído por Jesus, porque ele chamou apenas homens do sexo masculino", então eu fico indignada.

Você também vê mulheres chamadas ao sacerdócio.

Sim, isso não depende do gênero. Se a argumentação é "histórica", então todos os padres católicos deveriam se tornar judeus e casados.

Muitas pessoas se perguntam por que as mulheres são ativas na Igreja Católica dominada por homens.

Há coisas que me deixam com raiva, mas eu não me deixo que isso me afaste da minha igreja. Nesta Igreja, há muitos homens e muitas mulheres muito comprometidos – eu devo muito a alguns deles – e quero viver e poder oferecer isso a outros. Nisso, sou grata a uma tradição muito rica e profunda, segundo a qual Jesus quer ajudar as pessoas a alcançar uma liberdade que não é fácil de suportar. Eu penso na história do Grande Inquisidor de Dostoiévski, nos Irmãos Karamozov. Ninguém está imune à tentação de tomar tudo nas mãos e se tornar escravo do poder – e isso, naturalmente, é um tema presente também na Igreja.

Você apoia a Iniciativa da Desobediência [Pfarrer-Initiative ou Iniciativa dos Párocos]?

Posso compreendê-la muito bem e também compartilhar os seus conteúdos. É pesado ver o modo pelo qual esse debate é levado adiante publicamente, mas internamento eu o considero muito importante. O melhor seria que os conflitos fossem definidos diretamente.

A Iniciativa da Desobediência pode chegar a algum resultado?

Tenho minhas dúvidas. Os moinhos moem lentamente. Todos estão, mais uma vez, conscientes da urgência, inclusive os membros da hierarquia. Mas parece justamente que estes também se encontram perante um dilema.

O número de pessoas que vão embora da Igreja aumenta, e a Igreja se pergunta, preocupada, o que pode fazer a respeito. Qual é a sua receita?

Eu acredito que é preciso se mostrar confiável e encontrar a linguagem e os modos para tornar compreensível também a entrega incondicional a Deus. É preciso uma ancoragem profunda e interior no mistério de Deus para que se possa engajar de forma credível pela dignidade de todo ser humano. Um modo para expressar isso poderia ser admitir os divorciados em segunda união à comunhão. Também seria credível se se pudesse dizer diretamente que existe o ministério da pregação dos leigos – e graças a Deus ele existe. Mas oficialmente não se pode. Ou também se prestaria um serviço à verdade e à sinceridade se a vocação ao ministério ordenado não fosse ligada à forma de vida celibatária. Muitos padres vivem a sua relação escondidos, o que não ajuda ninguém. Isso é aceito pela população. Eu venho de uma paróquia em que era oficial que o pároco tinha uma namorada.
As religiosas também devem poder ter relacionamentos? Não só com Deus, mas com homens e mulheres?

É claro que nós vivemos relações – o ser humano é um ser de relação. Mas quando eu entro em uma congregação, renuncio conscientemente a relações exclusivas, especificamente a relações sexuais com um homem ou com uma mulher. Essa é uma vocação a uma forma de vida que para muitos é incompreensível, mas que existe evidentemente – e na qual é possível viver muito bem. Residência das salvatorianasOutra coisa é unir a vocação sacerdotal com a vocação ao celibato. Em muitos padres, percebe-se que eles têm uma maravilhosa capacidade de se relacionar e muitas vezes são muito estimados pelo povo, transmitindo com toda a sua vida o fato de serem de Deus para nós, seres humanos – mas não foram feitos para uma vida celibatária. Seria melhor que pudessem se casar e permanecer como padres. Colocariam muitas coisas em movimento.

A Igreja ainda é relevante hoje?

Na Igreja, há partes, estruturas que não são oportunas. E igualmente, na Igreja, existem pessoas, projetos que estão à frente do tempo. Do que as religiosas vivem?

Do trabalho das suas próprias mãos. As que nos precederam construíram muitas coisas. Algumas irmãs têm uma pensão do Estado, se foram professoras. Quanto ao resto, somos responsáveis. Devemos cuidar para que aquilo que economizamos e construímos seja também suficiente para a velhice e para as nossas tarefas aqui na Áustria e no mundo.

Uma religiosa como vocês recebe um salário mensal?

Temos a comunhão de bens. Isso significa que todos os salários vão para uma mesma conta. Algumas recebem uma espécie de "mesada", e o resto é posto à disposição. Outras fazem um orçamento. No início do ano, eu tenho que ver aquilo de que eu preciso, quais gastos importantes terei que fazer: quanto eu preciso para as férias, para os cursos, para os óculos novos... O orçamento é discutido na comunidade, e então recebemos esse dinheiro por um ano, com o qual temos que nos virar. Se há imprevistos, há um suplemento.

Você é a superiora provincial das salvatorianas. Como isso se deu?

Fui eleita. É um processo altamente democrático. Até na Igreja! Antes que eu possa ser escolhida superiora provincial, devem ser escolhidas as delegadas para o capítulo provincial. Todas as 91 irmãs salvatorianas da província da Áustria são envolvidas na escolha. Todas também são envolvidas na elaboração da proposta de três nomes, que é confirmada pela direção mundial da nossa comunidade, em Roma. Depois, as delegadas do capítulo provincial escolhem entre os três nomes indicados.

Quantos anos você tinha quando se tornou freira?

Quando eu entrei na congregação eu tinha 31 anos. A decisão de me tornar religiosa amadureceu lentamente. Não cresci em uma família religiosa. A percepção de Deus cresceu em mim. Isso me tocou e se tornou cada vez mais central na minha vida. Em um curso sobre acompanhamento espiritual, eu conheci alguns padres e religiosos, e constatei que eram pessoas muito animadas. Então, fiz a pergunta se a vida em uma congregação também poderia ser uma forma de vida para mim. Assim, cheguei à decisão de que gostaria de viver e moldar as minhas relações com as pessoas e com Deus nessa forma de vida.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Onda de contestação eclesial chega à Bélgica

"Em solidariedade com os irmãos da Áustria, da Irlanda e de muitos outros países". mais de 50 padres e leigos flamengos publicaram, no dia 19 de novembro, um manifesto em que convidam os seus bispos a promover reformas urgentes.

A reportagem é de Céline Hoyeau, publicada no jornal La Croix, 02-12-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Assim como no Apelo à desobediência, assinado em junho por 400 padres austríacos, eles também reivindicam o acesso à comunhão para os divorciados em segunda união, a ordenação de homens e mulheres casados e o acesso dos leigos à pregação das homilias.

"Uma comunidade eclesial organizada ainda é necessária", escrevem. "Mas a sua forma atual não corresponde mais às realidades atuais porque, tanto pela sua organização em paróquias, quanto pelo exercício da sua missão, ela ainda deixa tudo sobre os ombros do ministério ordenado, reservado unicamente aos homens, além disso celibatários. E como o déficit de vocações está longe de mudar, é preciso encontrar novos caminhos para sair desse impasse".

O lançamento do manifesto remonta ao padre Johan Dekimpe, pároco de Courtrai, 69 anos, a quem se uniram alguns coirmãos e um pequeno grupo de leigos.

Na sexta-feira, 25 de novembro, 5.500 pessoas haviam assinado o manifesto. [Neste sábado, 10 de dezembro, o sítio do manifesta já contava mais de 6.500 assinaturas].

Entre os signatários, figuram padres e leigos, além de personalidades conhecidas, como Roger Dillemans, reitor emérito da Universidade Católica de Leuven, e Paul Breyne, governador dos Flandres Ocidentais (1,2 milhão de habitantes).

Todos se dizem convictos de poder reunir "um amplo apoio" nas dioceses do país. "Também estamos convictos – escrevem – de que se, enquanto fiéis, tomarmos a palavra, os bispos irão ouvir e estarão prontos para promover um diálogo sobre essas reformas necessárias e urgentes".

O movimento de reforma também chegou à França, onde, embora sem encontrar uma repercussão tão ampla, cerca de 20 padres da diocese de Rouen se uniu ao apelo dos austríacos.


Fonte

domingo, 4 de dezembro de 2011

Uma espiritualidade ecumênica vivida hoje. Diálogo entre Hans Küng e Jürgen Moltmann

O papel de leigos e leigas, pastores e pastoras, celibato, Igreja, Ceia, eucaristia: esses e diversos outros pontos em aberto no debate ecumênico são abordados pelos teólogos Hans Küng e Jürgen Moltmann no diálogo que segue.

O encontro ocorreu durante a Jornada Ecumênica (Ökumenischer Kirchentag), em Munique, na Alemanha, em 2010. O texto foi publicado na revista Concilium, nº. 3, de 2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o diálogo.

Hans Küng – O nosso tema tem por título Uma espiritualidade ecumênica vivida já hoje. Acredito que posso dizer que nós já a vivemos. Quando Karl Barth, o grande teólogo reformado, me perguntou um dia: "O que há, propriamente, entre você e eu?", eu lhe respondi: "Em meio a nós dois, com efeito, propriamente nada, mas atrás de você e atrás de mim, há muito". Por isso, não podemos nos contentar com pequenas reformas. Devemos exigir uma nova reforma: não para uma divisão, mas pela unidade da Igreja.

Jürgen Moltmann – Para mim, o ecumenismo não é a composição das situações de fato das Igrejas atuais. Ecumenismo quer dizer: comunhão a partir da renovação das Igrejas, em nome de Jesus Cristo. Não é a unidade que traz a renovação, mas sim a renovação que traz a unidade. A esse respeito, quero dar um exemplo. Em 1962, aconteceu algo inesperado e de repente: o Concílio Vaticano II. Nada teve tanta influência sobre nós, protestantes, quanto o Concílio Vaticano II: naquele momento, admiramos e também invejamos os cristãos católicos por esse grande passo. Eu nunca vivi uma comunhão maior com os cristãos católicos do que durante o Concílio Vaticano II e, mais tarde, na revista Concilium, da qual, durante 20 anos, eu participei como coeditor. A Igreja conciliar: essa é a esperança de que eu alimento.

Hans Küng – Nesse sentido, a mudança de paradigma começou já naquele momento, mas se realizou apenas pela metade. Agora, temos a língua do povo, temos a liturgia do povo, temos também o cálice aos leigos, mas, por exemplo, ainda não temos o casamento para os padres. Do paradigma do Iluminismo temos a liberdade religiosa, temos a reviravolta com relação ao judaísmo, a reviravolta com relação às religiões mundiais e o mundo secular. Mas, no Concílio, não foi possível discutir muitas coisas, entre as quais a questão da contracepção – em 1968, chegou a encíclica Humanae Vitae –, a questão do celibato, a questão da intercomunhão eucarística. São todas questões que ficaram em aberto desde então, e não querem esperar mais 20 ou 30 anos!

1. Quem são os leigos?

Jürgen Moltmann – Por leigos [laicos], nós entendemos muitas vezes alguém não religioso, um não especialista, mas isso é completamente falso. O termo "leigo" [ou laico] vem de laos, ou seja, "povo", o povo de Deus. Um leigo é um membro do povo de Deus. E, desse ponto de vista, todo pastor, homem ou mulher, todos os bispos e o próprio papa de Roma é um leigo, um membro do povo de Deus. Eu fiquei muito entusiasmado pelo fato de o Concílio Vaticano II ter retomado a ideia de Igreja como povo de Deus, porque essa ideia reúne clero e leigos em uma grande comunhão.

Hans Küng – Dos bispos, veio o pedido de que, no início da Constituição sobre a Igreja Lumen Gentium, fosse posto um parágrafo sobre o povo de Deus, De populo Dei. Isso estava naturalmente em contraposição com a imagem de Igreja que, desde a Idade Média, tinha caracterizado a Igreja romano-católica: uma pirâmide com o papa, os bispos, os padres acima, e os leigos embaixo. Era algo revolucionário, e, mesmo assim, no Concílio, o aprovamos com uma grande maioria. Apenas o grupo curial foi contrário: os mesmos que, em grande parte, ainda estão agarrados ao poder e impedem que se tirem as consequências disso.

Jürgen Moltmann – Nós temos a expressão "o cristão maior de idade". A expressão inclui a coragem de um juízo próprio, de uma palavra própria, de uma fé própria. Chegaremos a uma época em que a fé pessoal terá mais importância, e a participação na fé da Igreja será mais fraca. Por isso, precisamos de cristãos que se tornaram adultos, maiores de idade. Os leigos devem se tornar cristãos maiores de idade na colaboração com o governo da Igreja: no concílio, nos sínodos e nas comunidades do redespertar. Se uma paróquia ou uma circunscrição eclesial se torna uma comunidade, então formam-se esses cristãos maiores de idade que também incluem, na sua comunhão, os párocos e os bispos. Na comunidade, cada membro é responsável pelo que nela acontece. É necessário pensar a Igreja a partir de baixo. E a Igreja de cima, a hierarquia, deve ser inserida na grande comunidade cristã.

2. Quem são os pastores e as pastoras?

Jürgen Moltmann – Se o próprio povo de Deus já é um povo sacerdotal, como se afirma no Novo Testamento, não resulta disso, talvez, o sacerdócio universal de todos os fiéis? Eu li isso também no Vaticano II. Mas, na tradição católica e no movimento católico de reforma, como o sacerdócio universal de todos os fiéis se relaciona com o sacerdócio especial de alguns ministros?

Hans Küng – O sacerdócio universal certamente é uma afirmação da Escritura. A passagem mais conhecida é a de 1Pedro 2, 9: "Vós sois uma nação eleita, o sacerdócio régio", e isso naturalmente também foi recebido pelo Concílio Vaticano II. Isto implica, depois, que os ministros oficiais não sejam os patrões da Igreja, mas sim seus servidores. O Novo Testamento, para indicar os ministros, não recorre a uma concepção civil qualquer, mas sim fundamentalmente a um conceito que não era usado, de fato, para esse fim, ou seja, o do serviço à mesa: um serviço simples, humilde, que, para indicá-lo, se usava a palavra diakonia. Compreenderam-se os ministérios eclesiais como diaconia, como serviço à comunidade. Isso também é dito com muita clareza pelo Concílio Vaticano II na Constituição sobre a Igreja. A questão, porém, é justamente qual rosto tem a prática efetiva. O papa chama a si mesmo de "servo dos servos de Deus", e essa é uma bela expressão de Gregório Magno, mas, de fato, ele se comporta como o senhor dos senhores e assim trata até mesmo os bispos.

No meu livro A Igreja Católica (1967; Ed. Objetiva, 2002), eu parti do fato de que, no fundo, todo cristão está habilitado a batizar. Isso não foi contestado por ninguém. Mas então se põe uma outra questão: o mesmo cristão não poderia, em certas circunstâncias, assegurar também o perdão dos pecados? Certamente, eles pode fazer isso, na esperança de que Deus perdoe os pecados. A eucaristia – isso é evidente – não foi dada a um indivíduo: ela foi dada a todos. "Fazei isto em memória de mim" é a afirmação que se refere à celebração da eucaristia. E, a partir dela, todo cristão está habilitado a celebrar a Eucaristia. Naturalmente, não no sentido de que, agora, alguém, sozinho, pode celebrar a missa para si, como me acusaram de defender. Não é esse o sentido. Mas, em princípio, um grupo de cristãos pode se reunir para celebrar a eucaristia. Embora outros o contestem, eu defendo que essa é uma celebração da eucaristia válida.

Jürgen Moltmann – Essa também é a práxis nas famílias evangélicas, e essa era a práxis nos campos de prisioneiros, em situações de emergência, e fico muito contente que, com relação a isso, sejamos da mesma opinião. Todos os fiéis batizados têm o direito de anunciar, de testemunhar a sua fé, de batizar e de partilhar a Ceia do Senhor. Na celebração evangélica da Ceia, nós nos dispomos de modo a formar um grande círculo e dirigimos reciprocamente as palavras da instituição: "Por ti dado, por ti derramado". Portanto, nós fazemos isso como uma grande comunidade, não como uma performance de um indivíduo ao altar para os muitos que são apenas destinatários, receptores.

Hans Küng – Pensemos na China: se ali um grupo de cristãos se reúne e celebra a eucaristia, se dirá que essa é uma celebração válida da eucaristia. Naturalmente, isso tem um altíssimo significado para o ecumenismo, já que não se pode negar a outros cristãos a validade da eucaristia só porque não entram novamente na sucessão apostólica.

Em uma situação normal, obviamente é o pároco quem preside a eucaristia, aquele que está à frente da comunidade. Essa é, em todo o caso, a tradição católica, e eu gostaria de conservá-la. Mas isso não deveria significar que nem todos, em última instância, podem presidir. E, se as coisas continuarem como estão, ou seja, que cada vez mais comunidades permanecem sem pároco, se poderá questionar o que essas comunidades devem fazer. O que é mais importante: a eucaristia ou o celibato?

Jürgen Moltmann – Muitos pastores e pastoras estão sobrecarregadas de compromissos, porque devem fazer de tudo ao mesmo tempo: pregar, ensinar, garantir o cuidado pastoral, visitar os doentes, prestar a diaconia, organizar círculos comunitários etc. O que fazemos em uma situação desse tipo? Devemos empregar mais "leigos" que ajudem o pastor, e, portanto, subdividir o conjunto dos carismas, dos dons pessoas e das exigências que confluem no ofício paroquial? Ou, inversamente, não seria melhor pensar a partir da comunidade e dos círculos domésticos, e depois redistribuir as diversas tarefas, por exemplo, a assistência pastoral nas casas de saúde, as visitas aos doentes e assim por diante? Mas são dons que, em uma comunidade, encontram-se em estado dormente. E então, justamente quando uma comunidade não tem um pastor, esses dons dormentes dos "leigos" muitas vezes se despertam.

Hans Küng – Uma afirmação totalmente fundamental em Paulo se refere justamente aos carismas: todo cristão tem os seus dons de graça, diz ele. Podem ser muito simples, como o dom de aconselhar, de ajudar, de curar. Também podem ser dons de direção. Na comunidade, existem os apóstolos, mas também profetas, mestres, teólogos etc. Em Paulo, portanto, não há simplesmente uma hierarquia, com base na qual alguém decide, e os outros são passivos. Eu penso que, em muitas comunidades, nós temos uma multidão de "leigos" que já exercem o seu carisma. Em ambas as confissões. E os párocos notaram que isso só funciona em grupo. Quem é, portanto, a Igreja? Como a Igreja é percebida publicamente?

3. Quem é a Igreja?

Jürgen Moltmann – Publicamente, a Igreja é percebida como Igreja institucional, como Igreja de bispos, como Igreja do papa. Deixando de lado, porém, aqueles grandes eventos que ganham o palco da televisão, a Igreja é, domingo após domingo, os três, quatro milhões de cristãos presentes nas igrejas, aqueles que durante a semana trabalham nas instituições diaconais, mas esse não é um bem igualmente "utilizável".

Hans Küng – E como a Igreja é percebida privadamente?

Jürgen Moltmann – No âmbito privado, temos uma imagem de Igreja com a qual só dificilmente podemos nos identificar. Nos escritórios paroquiais, somos catalogados como frequentadores das funções litúrgicas. Como se nós só existíssemos para frequentar o culto divino! E, na Ceia, somos contados como convidados, como se não fizéssemos parte da família. Mas é uma coisa impossível. Por isso, a minha tese é esta: a comunidade é a crítica da Igreja oficial e o seu futuro! Uma comunidade é mais do que uma circunscrição eclesiástica. No âmbito evangélico, há a tentativa de tornar a Igreja mais atraente na sua oferta religiosa, com a ajuda de consultores empresariais. Mas isso não nos degradaria a clientes da Igreja e dos seus aparatos? As comunidades nas quais vivemos, porém, não são associações locais da igreja territorial! A igreja territorial, ao contrário, é a união das igrejas vivas nesse determinado lugar!

Hans Küng – Nós, católicos, temos o problema oposto. Na Alemanha, em breve, apenas um terço das comunidades ainda terá um pároco. Tudo isso é mascarado, agregando diversas comunidades e chamando o resultado dessa operação de "circunscrição ou unidade pastoral". Temos agentes de pastoral que, no domingo, correm freneticamente de uma igreja à outra. Na Idade Média, eles seriam chamados de "padres de missa": limitam-se a celebrar a missa e depois são forçados novamente a sair de novo imediatamente. Assim, naturalmente, as comunidades se desintegram. No entanto, como se passa da Igreja da assistência religiosa à Igreja da participação ativa? Como a Igreja “para” o povo se torna uma Igreja “do” povo?

Jürgen Moltmann – Na história da Igreja evangélica, temos um exemplo: as comunidades espontâneas da Igreja confessante [ou confessional] na época do nacional-socialismo. Elas não eram articuladas de modo hierárquico, mas sim organizadas mediante os chamados "conselhos de irmãos". Eram comunidades que, na situação de opressão por parte do Estado e do partido, financiavam por sua própria conta os seus pastores. Entrava-se em uma comunidade desse tipo por explícita escolha e se recebia uma carta que atestava que você era seu membro.

Em Tübingen, temos hoje a comunidade de São Tiago. De circunscrição eclesiástica, tornou-se uma comunidade e precisamente por meio de 20 círculos domésticos. Esses círculos domésticos preparam as liturgias. As atividades da comunidade não se concentram na pessoa do pastor, que não deve estar em toda parte. Cada um é um especialista da sua própria vida, das suas capacidades, da sua fé. Quando o pastor que começou tudo isso se aposentou, a comunidade geriu sozinha as suas liturgias por nove meses. E a Igreja estava tão cheia como antes. Para mim, esse é um exemplo de como se passou de uma Igreja da assistência para uma Igreja da participação ativa.

Hans Küng – Portanto, se o ambiente-catolicismo não funciona mais, e se nem aquilo que antes constituía a cultura protestante não existe mais nessas modalidades, então o fato de participar ou não depende completamente da decisão do indivíduo.

Jürgen Moltmann – Sim, estou convencido disso, a não ser que os indivíduos sejam, naturalmente, pessoas que vivem para si mesmas. Eles vivem em relações, em famílias, em grupos de amigos etc. Mas pertencer a uma comunidade e participar dela ativamente é uma decisão pessoal.

4. A situação do ecumenismo e a questão da hospitalidade eucarística

Jürgen Moltmann – Acredito que o motivo mais profundo para o ecumenismo é a oração dirigida por Jesus ao Pai: "Que todos sejam um" (João 17, 21). E acredito que essa oração é ouvida, de forma que nós, no fundo, já somos um. Por isso, para mim, o ecumenismo significa: no fim, cresce junto aquilo que pertence a todos. Mas qual forma de crescer juntos existe hoje?

Hans Küng – Fundamentalmente, é verdade: no Espírito, já são um. Somos unidos no batismo, que as Igrejas reconhecem reciprocamente, e, se todos nós somos batizados no nome de Jesus Cristo, em Jesus Cristo somos um. Isso deveria ser levado muito mais a sério do que costumamos fazer.

Eu rejeito o ecumenismo de retorno. O fato de que o meu antigo colega, o atual Papa Bento XVI, tenha oferecido aos párocos e aos bispos anglicanos conservadores, em troca do seu retorno a Roma, a possibilidade de não observar o celibato, eu vejo isso como o contrário do que o Concílio queria. Nós queríamos que nos renovássemos por “ambas” as partes e nos orientássemos segundo o evangelho e não fôssemos novamente à caça na reserva dos outros, para nos adonar dos indivíduos. O que você pensa da fórmula da "diversidade reconciliada"? Não vai acabar em um ecumenismo que permanece estático? Constatamos que somos diferentes. Eu não valorizo o fato de que não seja evidenciado o perfil cristão comum, mas sim o perfil luterano com relação ao perfil romano. Já tínhamos superado isso.

Jürgen Moltmann – Eu também acho. No diálogo inter-religioso, por exemplo, eu sinto uma profunda comunhão com os teólogos católicos, porque, diante de outros, podemos falar a uma só voz. Lembro-me de um colóquio com marxistas, em 1968, na Tchecoslováquia. Josef Hromádka, Johann Baptist Metz e eu representávamos o cristianismo de um modo totalmente natural a uma só voz. Algo semelhante acontece no diálogo com os judeus. O judaísmo não tem uma relação especial com a Igreja evangélica e uma relação diferente com Roma. Com relação ao judaísmo, nós, cristãos, falamos a uma só voz e, nisso, estamos próximos uns dos outros.

Uma pergunta dirigida aos teólogos é justamente esta: ainda existem diferenças, sobretudo doutrinais, que tornam impossível a comunhão eucarística? E há 40 anos, entre teólogos, evangélicos e católicos, existe um comum acordo em dizer que não há nenhuma. Anos atrás, havia a proposta Rahner-Fries. Antes da primeira Jornada Ecumênica de 2003, em Berlim, os institutos ecumênicos verificaram o tema e disseram a mesma coisa. Alguns teólogos, que hoje são cardeais, afirmaram que o escândalo da divisão entre cristãos na eucaristia é muito mais grave do que o escândalo de grupos individuais que vão à frente e celebram juntos a eucaristia.

Hans Küng – A Comissão para a Fé e a Constituição da Igreja do Conselho Ecumênico de Igrejas, em 1982, juntamente com representantes oficiais da Igreja Católica, já haviam emitido a Declaração de Lima sobre batismo, eucaristia e ministério. Nela, também foi estabelecida a comum "liturgia de Lima". Segundo essa declaração, todos os pontos controversos – sacrifício expiatório, presença real, ministérios – pode ser apropriadamente considerados como resolvidos. Todos os cristãos podem afirmar com o Documento de Lima: "É Cristo quem convida ao banquete e o preside .[...] Na maior parte das Igrejas, essa presidência é representada por um ministro ordenado. […] O ministro (minister) da eucaristia é o embaixador que representa a iniciativa de Deus e expressa o vínculo da comunidade local com as outras comunidades locais na Igreja universal". Além disso, em 1971, houve o encontro ecumênico de Pentecostes em Augsburg, no qual simplesmente foi praticada a intercomunhão. Em 1971! Portanto, se queremos ir adiante, devemos realizar necessariamente de novo uma autoajuda.

Jürgen Moltmann – Nos anos 1970, experimentamos em Tübingen um grupo ecumênico de trabalho, no qual a Bíblia era lida e pregada em comum. De vez em quando, surgia a questão: não podemos também celebrar em comum a eucaristia? Um padre jesuíta e eu estávamos encarregados de preparar uma liturgia. Pensava-se que, para fazer isso, precisaríamos de algumas semanas, mas depois de três horas estávamos prontos! De fato, nós não estamos tão longes um do outro. Depois, celebramos a eucaristia juntos – e todos ficamos muito satisfeitos.

Naquele momento, não tornamos isso público. Nesse meio tempo, no entanto, a pressão se tornou tão forte que era preciso dar passos posteriores. Podia-se iniciar com os casais de esposos de confissões diferentes. O que Deus uniu, o homem não deve separar. E nem a Igreja Católica. E especialmente não na eucaristia, à mesa do Senhor. Isso é impossível e insuportável. De fato, a partir dessa experiência, ou saem casais ateus, que não frequentam mais nenhuma Igreja, ou eles vão juntos a uma só Igreja.

Um segundo passo a ser dado seria talvez que os cônjuges divorciados e separados não sejam excluídos também da eucaristia, porque, provavelmente, são eles que mais precisam dela. E o terceiro passo seria a hospitalidade eucarística, o fato de nos convidarmos reciprocamente. A esse respeito, eu gostaria de dar um testemunho pessoal: todas as vezes em que eu me encontro presente em um culto litúrgico e ouço a voz de Cristo: "Por ti dado, por ti derramado", eu participo dele. E até agora nunca fui rejeitado. No grupo dos editores da revista Concilium, sempre havia uma celebração eucarística, e os meus amigos católicos sempre vinham ao meu encontro e me convidavam com eles para essa celebração da eucaristia, e eu ouvia a voz de Cristo.

Hans Küng – A questão não é tratada de modo coerente nem mesmo em Roma: se forem as pessoas certas, é feita uma exceção. O Papa Bento XVI ofereceu a eucaristia ao fundador da Comunidade de Taizé, o teólogo reformado Roger Schutz. Quando ele era professor em Tübingen, Joseph Ratzinger participou de uma celebração da eucaristia, onde muitos católicos e protestantes estavam uns ao lado dos outros. Na verdade, ele ainda era então da opinião de que os irmãos ortodoxos devem ser vinculados só aos Concílios aos quais eles mesmos participaram, isto é, aos primeiros sete. Isso seria, naturalmente, uma grande simplificação. Mas eis que isso não foi feito, em certas circunstâncias, contra as melhores forma de ver anteriores. Por isso, eu também sou da opinião de que devemos assumir pessoalmente o comando da situação agora e simplesmente seguir em frente.

Jürgen Moltmann – A esse respeito, quero expressar ainda um pensamento audaz: antes vem a experiência, depois a teoria! Primeiro a práxis, depois a teologia! Na Ceia e, respectivamente, na eucaristia, nós celebramos não as nossas teorias, mas sim a presença do Cristo vivo! E, por isso, eis a minha proposta: primeiro vem o comer e o beber, e só depois ficamos na mesa para discutir – na presença viva do Cristo – as nossas diferenças, para resolver as nossas controvérsias etc. Portanto, primeiro a comunhão na Ceia do Senhor e depois a discussão sobre a teoria e a teologia.


Fonte

Católicos belgas lançam manifesto por reformas na Igreja

Na semana anterior ao início do Advento, quatro padres flamengos lançaram um manifesto por reformas na Igreja que pedia a permissão da indicação de leigos como párocos, líderes litúrgicos e pregadores, e pedia a ordenação de homens e mulheres casados como sacerdotes.

A análise é do teólogo norte-americano John A. Dick, professor da Universidade de Ghent, que viveu por 30 anos na Bélgica. O artigo foi publicado no sítio National Catholic Reporter, 02-12-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Até o final da semana, mais de 4.000 católicos publicamente ativos haviam assinado o manifesto Os fiéis tomam a palavra. No dia 1º de dezembro, o número de signatários havia alcançado os 6.000 [neste sábado, 3, o número já havia superado os 6.500].

Entre os apoiadores estão centenas de padres, educadores, acadêmicos e profissionais católicos. Dois apoiadores proeminentes são os ex-reitores da Universidade Católica de Leuven, Roger Dillemans e Marc Vervenne.

"Não são 'pessoas de protesto'. São pessoas de fé. Elas estão levantando as suas vozes. Elas esperam que seus bispos estejam ouvindo", disse o Pe. John Dekimpe, um dos quatro padres que lançaram o manifesto.

"Algumas pessoas têm medo de se aproximar das lideranças da Igreja", disse o padre, que vive em Kortrijk. "Isso é ser dissidente? Eu não acho. A Igreja belga é um desastre. Se não fizermos algo, o êxodo dos que abandonam a Igreja nunca vai parar. Eu realmente quero que os bispos reflitam profundamente sobre o crescente descontentamento de tantos fiéis".

Entre as demandas do manifesto, feitas "em solidariedade com os irmãos da Áustria, da Irlanda e de muitos outros países", estão as seguintes:

  • Que a liderança das paróquias seja confiada a leigos formados;
  • Que os serviços de Comunhão sejam realizados mesmo quando nenhum sacerdote esteja disponível;
  • Que os leigos possam pregar;
  • Que as pessoas divorciadas possam receber a Comunhão;
  • Que, "no menor tempo possível, mulheres e homens casados também sejam admitidos ao presbiterato".

Até agora, não houve nenhuma reação oficial do arcebispo André-Joseph Léonard, o primaz católico da Bélgica, nem de outros bispos da Bélgica ou do Vaticano. Privadamente e nos bastidores, um bispo belga aplaudiu o manifesto.

Jürgen Mettepenningen, teólogo de Leuven e ex-assessor de imprensa de Léonard, disse ao jornal belga De Morgen que espera que o manifesto possa levar a uma reforma da Igreja bem elaborada. "Quando eu reflito sobre o que eu escrevi e disse nos últimos anos, eu só posso dizer que o espírito do manifesto é o mesmo espírito no qual eu tentei trabalhar para tornar a Igreja mais credível: fiel à fé".

No ano passado, depois que as denúncias de abuso abalaram a Igreja belga, uma comissão independente descobriu abusos sexuais na maioria das dioceses, internatos e ordens religiosas católicas. A comissão disse que 475 casos de abuso haviam sido denunciados a ela entre janeiro e junho deste ano.

Em um dos casos mais proeminentes, o ex-bispo de Bruges, Roger Vangheluwe, foi forçado a renunciar depois de admitir que abusou do seu sobrinho durante anos. Em abril deste ano, ele disse à televisão belga que havia molestado de outro sobrinho e que tudo tinha começado "como uma brincadeira".

Leia aqui o texto completo do manifesto Os fiéis tomam a palavra.


Fonte

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Manifesto ''Os fiéis tomam a palavra''

Desta vez, são os fiéis católicos flamengos, padres e leigos, da região do Flandres, no norte da Bélgica, que “tomam a palavra” e pedem reformas à Igreja, pelo fim de problemas como as paróquias sem padres, as celebrações eucarísticas em horários inapropriados e as celebrações da palavra sem comunhão.

Mais de 6 mil pessoas já assinaram o manifesto.

O texto foi publicado na revista JA - Die Neue Kirchenzeitung, 04-12-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Paróquias sem padres, celebrações eucarísticas em horários inapropriados, celebrações da palavra sem comunhão: tem que ser assim? Por que as reformas necessárias da Igreja não são feitas? Nós, fiéis flamengos, pedimos que os nossos bispos encontrem uma saída ao impasse em que estamos. Fazemos isso em solidariedade com os irmãos da Áustria, da Irlanda e de muitos outros países, que também clamam por reformas que são vitais para a Igreja.

Nós não entendemos por que a liderança das nossas comunidades locais (as paróquias, por exemplo) não é confiada a um homem ou a uma mulher, casado ou não, profissional ou voluntário, que tenha recebido a necessária formação. Precisamos de pastores comprometidos.

Nós não entendemos por que esses fiéis não podem presidir as celebrações dominicais. Precisamos. em todas as comunidades vivas, de ministros litúrgicos.

Nós não entendemos por que – onde nenhum padre está à disposição – não é permitida uma celebração da Palavra de Deus com a comunhão.

Nós não entendemos por que leigos qualificados e animadores de celebrações adequadamente preparados não podem pregar. Precisamos da Palavra de Deus

Nós não entendemos por que deve ser negada a comunhão a fiéis de boa vontade que, depois de um divórcio, se casaram novamente. Assim como os outros, eles pertencem à comunidade.

Felizmente, já há lugares onde se age assim.

Pedimos também que, no menor tempo possível, mulheres e homens casados também sejam admitidos ao presbiterato. Nós, fiéis, precisamos isso desesperadamente.

Confira aqui o texto no original.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Alemanha: bispos rejeitam a demanda pelo diaconato feminino

Os bispos alemães rejeitaram as reivindicações relativas ao acesso das mulheres ao diaconato, reavivando as tensões entre bispos e leigos na Alemanha. O padre Hans Langendörfer, secretário da Conferência Episcopal da Alemanha em Bonn, refutou os argumentos do Comitê Central dos Católicos Alemães (ZDK), que adotou uma resolução nesse sentido na sexta-feira, 18 novembro, durante a sua assembleia geral de outono, em Bonn.

A reportagem é do sítio Catho.be, 21-11-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

O padre Langendörfer expressou um profundo pesar pela decisão do Comitê Central dos Católicos Alemães (ZDK), a mais poderosa organização de leigos na Alemanha. Ele definiu essa reivindicação de um "pesado fardo" para o diálogo interno da Igreja. Ele reconheceu que Dom Robert Zollitsch, arcebispo de Friburgo, e presidente da Conferência Episcopal Alemã, encorajou o diálogo e disse que não deve haver proibições para as reflexões do processo de diálogo. Mas, para o padre Langendörfer, a resolução do ZDK aumenta a pressão e atinge o processo de diálogo entre os bispos e o ZDK.

No sábado, 19 de novembro, o presidente do ZDK, Alois Glück, rebateu essa crítica. "É nosso dever fazer com que tais demandas sejam ouvidas", respondeu, durante a assembleia geral do ZDK em Bonn. Ele lamentou que Conferência Episcopal Alemã, com as suas críticas, tenha abandonado as posições que ela mesma tinha adotado há muito tempo. Na verdade, apontou, já são 30 anos que os bispos alemães haviam convidado a realizar um exame teológico da questão do diaconato feminino.

Na sexta-feira passada, depois de ardentes debates, o ZDK votou uma resolução que pede o acesso das mulheres ao diaconato. Os delegados também convidaram os fiéis católicos a se unirem à rede "diaconato da mulher". Os delegados lembraram que a diaconia na Igreja é exercida de várias formas pelas mulheres, razão pela qual as diaconisas são indispensáveis.

O Comitê Central dos Católicos Alemães destaca a necessidade de uma mudança de "mentalidade e de estruturas" dentro da Igreja. No que se refere ao acesso das mulheres ao sacerdócio, o ZDK quer continuar as discussões sobre a questão dos ministérios e manter aberto o debate teológico sobre essa questão. As posições defendidas pelo Comitê Central foram adotadas por 129 delegados contra 16 e 7 abstenções.

O ZDK constata ainda que a proporção das mulheres nos órgãos de decisão da diocese – nos quais não é necessária a ordenação sacerdotal – ainda é geralmente muito fraca e que continua o hábito de colocar padres exclusivamente nesses lugares. Essa prática deve ser mudada, defende o ZDK, e, nesse caso, as mulheres deveriam ter as mesmas chances dos homens, em particular no setor da gestão financeira das dioceses ou no âmbito da pesquisa teológica e do ensino da teologia.

Essas reivindicações foram amplamente defendidas pelos leigos alemães. A Comunidade das Mulheres Católicas da Alemanha (KFD) já havia pedido, em julho passado, a introdução do diaconato para as mulheres.

Ao contrário do presbiterado, o diaconato feminino poderia "ser rapidamente aceito", declarou Anna Maria Mette, vice-presidente da KFD, durante a jornada das mulheres da diocese de Münster sobre o tema "Verdadeiramente mulheres". Ela também pediu que as mulheres tivessem um maior acesso às funções de direção na Igreja e pudessem contribuir para a formação dos padres.

fonte

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Padres austríacos se recusam a revogar seu apelo à desobediência

Membros da Iniciativa dos Párocos Austríacos, liderados pelo ex-vigário-geral de Viena, Mons. Helmut Schüller, disseram não poder revogar o Apelo à Desobediência emitido por eles no dia 19 de Junho. Em seu último boletim, os 407 sacerdotes e diáconos dizem: "Foi-nos pedido que nos retratemos do texto do 'Apelo à Desobediência', mas não podemos fazer isso em sã consciência porque continuamos convictos do seu conteúdo".

A reportagem é de Christa Pongratz-Lippitt e Sarah Mac Donald, publicada na revista católica britânica The Tablet, 08-10-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Os sacerdotes exigem a reforma ou o diálogo sobre as questões do celibato sacerdotal, do sacerdócio feminino e da comunhão a divorciados e a pessoas em segunda união. Eles também querem o reforço do papel dos leigos na Igreja.

"A desobediência com relação a certas leis e regras eclesiásticas restritivas em vigor há anos faz parte da nossa vida e do nosso trabalho pastoral. Declarar publicamente algo diferente do que pensamos e de como agimos tornaria ainda mais aguda a dissonância na Igreja e na pastoral", disseram eles na carta. Eles estavam plenamente conscientes de que a palavra "desobediência" poderia ser inflamatória, mas insistiram: "Não entendemos uma desobediência generalizada por gosto da contradição, mas sim uma obediência graduada, que devemos sobretudo a Deus, depois à nossa consciência e por fim às disposições eclesiásticas".

Falando esta semana em Dublin, onde se dirigiu a um encontro da Associação Irlandesa dos Padres Católicos (ACP), Mons. Schüller disse à The Tablet que, quando ele se tornou vigário geral em Viena, em 1995 – cargo que ele ocupou até 1999, trabalhando junto ao arcebispo Christoph Schönborn –, ele tinha esperança de mudança na Igreja, em linha com o que havia sido permitido pelo Concílio Vaticano II. "Mas agora temos a suspeita de que o Vaticano quer que a Igreja vá para trás", disse. Ver a Igreja como uma "fortaleza contra o mundo e contra o mundo secular" não era a forma que o Concílio Vaticano II pensou, argumentou ele.

Uma questão-chave hoje pertence ao papel dos leigos/as batizados/as – que "não são apenas compradores em alguma loja, mas sim pedras do edifício da Igreja". Eles devem crescer em influência e em participação nas decisões da Igreja, disse ele, "por causa da sua abundante experiência de vida". Ele disse que a Igreja "tem medo dos leigos porque ela os vê como pessoas infectados pela secularização e pelo relativismo". As preocupações da Iniciativa sobre o sacerdócio, disse, estão baseadas nos direitos reconhecidos pela ONU para que os homens se casem, e nos direitos iguais das mulheres reconhecidos pelo mundo secular, mas não, ele disse, pela Igreja.

Em seu boletim informativo, os sacerdotes disseram que haviam sido aconselhados a discutir algumas das reformas "mais simples" exigidas por eles com o cardeal Schönborn, mas eles estavam preocupados em evitar uma discussão das reformas "apenas entre alguns poucos membros do clero superior", reformas estas que dizem respeito a todos os fiéis do "clero inferior".

Fonte

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Família Arnaldina realiza curso de fotografia em Juquiá




Por Cláudia Pereira

Grupo de Jovens participaram da segunda etapa do curso de fotografia, ministrado por integrantes do grupo de leigos Família Arnaldina, realizado dia 24 de Setembro na Paróquia Santo Antônio em Juquiá. O curso é parte dos trabalhos de missão do grupo de leigos que já desenvolve outros trabalhos na comunidade do Vale do Ribeira. O primeiro curso de fotografia realizado no mês de maio reuniu quinze jovens que tiveram conhecimentos básicos e teóricos da fotografia e o valor da comunicação na comunidade.

Nesta segunda etapa do curso, os jovens aprenderam a importância da fotografia como informação e colocaram em prática os conhecimentos da primeira aula realizando vários clic`s na cidade. Na perspectiva de um novo olhar com a fotografia, os jovens saíram pela cidade registrando o que para eles era diferente. Depois da saída fotográfica os orientadores do curso selecionaram as dez melhores fotografias, que serão expostas na comunidade. O curso é estímulo para a garotada e já deu resultados, a paróquia de Santo Antônio agora dispõe da Pastoral da Comunicação e de um boletim informativo da PJ. “Voltamos pra casa felizes com o resultado” diz o grupo que na próxima etapa levará mais trabalhos na bagagem para alegrar os jovens e toda a comunidade. E neste sentido, a Família Arnaldina começa a semear a semente da esperança.


A Família Arnaldina em momentos de oração com os noviços



segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O que isso tem a ver com a evangelização?

Por José Lisboa Moreira de Oliveira (Filósofo. Doutor em teologia. Ex-assessor do Setor Vocações e Ministérios/CNBB. Ex-Presidente do Inst. de Past. Vocacional. É gestor e professor do Centro de Reflexão sobre Ética e Antropologia da Religião (CREAR) da Universidade Católica de Brasília)

Tenho aqui sobre a minha mesa de trabalho um cartaz da festa de padroeira de uma paróquia do Distrito Federal. Sabe-se que é festa de igreja pela manchete e porque nele há a imagem da padroeira. Do contrário seria impossível saber. De fato, o cartaz não fala de nenhum momento evangelizador, de nenhuma celebração litúrgica, mas convida o público para uma grande farra regada com muita bebida e muito barulho de várias bandas de cantores sertanejos. Além do anúncio da farra, das bandas e dos nomes dos patrocinadores, o cartaz traz a informação do preço do bilhete para entrar na farra e a indicação dos locais onde ele pode ser adquirido. Nada contra a cervejinha, pois também gosto de saboreá-la de vez em quando. Nada contra as bandas sertanejas, embora eu prefira escutar sempre a música raiz, tocada por autênticos violeiros caipiras. Mas fiquei me perguntando: o que isso tem a ver com a evangelização?

Chego em casa, depois de um dia de trabalho, e ligo a TV. Começo a mexer nos canais, tentando encontrar alguma coisa pra ver. Deparo-me com um programa católico de TV. O programa se diz voltando para a evangelização do público jovem, mas tem tudo para ser um programa humorístico. De fato, alguns jovens, com cara de quem comeu e não gostou, fazem algumas perguntas e um padre com rosto angelical, de quem não tem sexo, responde às perguntas. Lá pelas tantas, um desses jovens, com cara de mais esperto, pergunta onde encontrar na Bíblia a prova de que não se pode fazer sexo antes do casamento. O padre começa dizendo que, com os jovens, é preciso falar claro e vai direto ao ponto: "No livro do Gênesis, na primeira página da Bíblia, pois lá está escrito: ‘por isso o homem deixa seu pai e sua mãe, e se une à sua mulher, e eles dois se tornam uma só carne’”. Gostei do programa "humorista”, pois dei uma boa gargalhada. Mas depois fiquei sério e me perguntei: isso é evangelização?

Continuei a mexer nos canais e, de repente numa outra TV católica estava acontecendo um debate sobre o celibato. Respondia um padre solenemente empacotado pelas vestes clericais. De repente o apresentador faz uma "provocação” ao entrevistado: "o padre não casa, não tem mulher, não tem filhos. No final do dia, depois que todo mundo vai embora da igreja, ele não sente solidão?” O padre entrevistado, com ares de quem pensa que todo mundo é bobo, responde com uma grande asneira (lembro que asneira vem de "asno”!): "Não, eu não sinto solidão, eu sinto soledade. Soledade é viver com Jesus e quem está com Jesus não está sozinho. Não tem a Nossa Senhora da Soledade? Pois é, eu não sinto solidão, mas soledade”. Dei uma baita de uma gargalhada. Sem querer, estava novamente assistindo a um programa televisivo de humor. Mas, cansado por causa do dia de trabalho, fui pra cama com a pergunta: por acaso isso é evangelização? Porém, antes de dormir, passei pelo meu escritório e pequei um dicionário para ver o que significava a palavra soledade. Estava escrito: "soledade, o mesmo que solidão”. Dei outra risada bem gostosa. Minha mulher, lá do nosso quarto, escutou e ficou curiosa, querendo saber por que eu estava dando tantas risadas gostosas. Quanto lhe contei os episódios, caímos os dois numa gostosa gargalhada. Mas a pergunta ficou no ar.

Sabemos que o verbo evangelizar (euangelizesthai), e o substantivo evangelho (euaggelion), desde os tempos áureos da antiga Grécia, significam literalmente anúncio de uma boa notícia. Estes termos estão na raiz da palavra evangelização. Em Israel o correspondente hebraico do verbo e do substantivo grego também tem o mesmo significado: anúncio de uma boa e confortante notícia. Os termos eram usados de modo especial para falar da alegre notícia da salvação e da libertação trazidas por Javé. "Como são belos sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz, que traz a boa notícia, que anuncia a salvação, que diz a Sião ‘Seu Deus reina’” (Is 52,7).

Com a chegada de Jesus os termos evangelizar, evangelho e evangelização ganham uma conotação especial. Permanecem significando anúncio de uma boa notícia, mas acrescidos de um detalhe importante: boa notícia para os pobres e oprimidos. "O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa Notícia aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos, e para proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4,18-19). É claro que Jesus, citando Isaías, não inventa a evangelização dos pobres, mas, segundo Lucas, torna-a programa oficial da sua missão e, de consequência, da missão dos cristãos e das cristãs.

Desde o Concílio Vaticano II não se tem feito outra coisa a não ser proclamar solenemente que a missão da Igreja é evangelizar. Mas, quase cinquenta anos depois, chego à conclusão de que boa parte da Igreja, senão toda ela, não sabe e não quer evangelizar. Os exemplos acima, que podem ser multiplicados aos milhares, revelam isso com clareza. Onde está a boa notícia para os pobres, para os oprimidos, para os sofridos? Para que servem as festas de padroeiro e os programas televisivos católicos? De que forma os pobres, as vítimas da opressão, os oprimidos estão sendo evangelizados?

Se aquela festa, anunciada pelo cartaz da paróquia, fosse em benefício dos pobres, não restaria dúvida de que seria uma verdadeira festa evangelizadora, mesmo que a base de muita cerveja e de bandas sertanejas. Dois meses atrás, participei de uma festa junina aqui no Distrito Federal, promovida pelos espíritas em favor de uma casa para idosos. Na festa não tinha bebida alcoólica, por uma opção da direção da instituição, mas tinha todas as outras bebidas e comidas típicas do São João. O diretor, que também é meu colega de trabalho, me disse que este abrigo para idosos é mantido pelo trabalho de voluntários, pelas doações das pessoas, por esta festa junina e por outra que é realizada por ocasião do Natal. E quem visita o abrigo sabe como os velhinhos são bem cuidados.

Portanto, não há mais evangelização em nossos dias, exceto em determinadas ocasiões e lugares. A Igreja perdeu definitivamente o rumo e não consegue levar boa notícia a ninguém, particularmente aos destinatários escolhidos por Jesus em seu pronunciamento na sinagoga de Nazaré.

O que se vê hoje são verdadeiros espetáculos de puro exibicionismo, voltados para a alimentação da egolatria de certos dirigentes e lideranças. As festas paroquiais estão destinadas ao lucro, a arrecadação de dinheiro para o sustento da "pastoral de manutenção” e para manter o luxo e a ostentação de certas lideranças, particularmente de padres e bispos que vivem às custas dos pobres, com a desculpa de que estão evangelizando. Poucos dias atrás me encontrei com um grupo de uma determinada paróquia de um bairro pobre do Distrito Federal. As pessoas se queixavam das constantes viagens do pároco à Terra Santa e Europa, deixando a paróquia no abandono, enquanto continua extorquindo dinheiro do povo pobre para custear suas peregrinações.

Tem razão Paulo Suess quando recentemente perguntou: "Quo vadis ecclesia? Para onde vais, Igreja?”. Ele mesmo sugere a resposta: "Estou indo por aí”. E eu, parafraseando o Cardeal Newman, acrescento: "como uma tonta”.

Fonte

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Coordenação em Reunião

A coordenação da Família Arnaldina (Nelson Tyski, Ricardo Oyamada, Luiz Catapan, Marília Wiesenhofer e Luiz Walter de Souza em reunião com Pe. Omir Oliveira








domingo, 24 de julho de 2011

A minha paróquia: construção, desconstrução, aflição

Eis a história da minha paróquia, que eu amei porque me formou e me fez crescer. E agora eu não reconheço mais a sua linguagem e vejo que ela assume o rosto empoeirado do passado.

O relato é de Jeannine Antoine, leiga da Bretanha, na França, publicado no sítio Garrigues et Sentiers, 19-07-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Quero contar-lhes a vida da minha paróquia desde o primeiro dia em que a integrei, depois de uma mudança. Abrange 35 anos, um caminho de fidelidade, por assim dizer.

Quando cheguei à minha nova paróquia em 1975, ainda bem jovem, o pároco encarregado pela pastoral havia me impressionado muito pela força das suas homilias: eram límpidas, bem estruturadas e apresentavam uma mensagem evangélica que descia ao coração e o habitava. Fundamentadas sobre a Palavra de Deus, elas iluminavam o meu caminho.

Em suma, eu encontrei naquele pároco um guia espiritual sem par. Pouco a pouco, a minha vida cristã, até então limitada à prática religiosa, se transformou, porque eu havia descoberto, graças a ele, um Cristo relacional esplendente de amor e de verdade. A paróquia tornou-se para mim a "montanha de Sião", a minha fonte de água viva.

Quando me foi solicitado, eu me tornei catequista para as crianças das escolas públicas e, com elas, redescobri o Evangelho passo a passo, como quando se livra um caminho dos espinhos. O diálogo da oração dialogante tornou-se familiar para mim. Tudo ia bem!

Mas, em 1996, depois de 22 anos de serviço, esse pároco pediu para se aposentar. Algo muito normal!

Ele foi substituído por um padre diferente em todos os sentidos. Por 22 anos, estivemos todos os domingos como na "Câmara Alta do cenáculo" e havíamos sido conduzidos a renascer do alto, pelo Espírito Santo. E, de repente, o novo pároco nos fazia descer ao nível da terra, porque a missão “ad gentes” do Concílio Vaticano II, isto é, a pregação do Evangelho a todos os homens era a sua maior preocupação. "Vão aos seus bairros, saiam dos seus cenáculos!", ele nos dizia, "a missão é ir ao encontro dos outros".

Logo, os paroquianos entenderam que perderiam a sua tranquilidade e que a bem-aventurança do Tabor havia acabado.

Alguns não suportam isso e abandonaram a paróquia; outros permaneceram, e eu estava entre estes últimos. Arregaçamos nossas mangas para fazer reuniões de bairro, visitas às casas, criar um jornal paroquial gratuito (distribuído por voluntários em todas as caixas de correio), organizar centros de bairro etc. Em síntese, sentíamos as correntes de ar atravessando paróquia, de tanto que a abertura era grande e exaltante.

Mas, depois de oito anos, para a surpresa de todos, esse pároco foi transferido, depois de um abaixo-assinado de um grupo de paroquianos em desacordo com a "administração".

Na falta de um sucessor adequado, a paróquia foi então fundida à que estava mais perto, já que os dois campanários distavam apenas 300 metros. De rivais como sempre haviam sido, as duas paróquias se viram obrigadas a trabalhar juntas. O pároco "comum", relativamente jovem (44 anos), homem fino e inteligente, soube conduzir o barco sem fazê-lo afundar. Grande arte pastoral!

Ele nos persuadiu da necessidade de “ampliar as estacas da tenda”, de romper as barreiras dos hábitos comunitários, de nos adaptarmos mutuamente. Para mim, essa experiência foi um salutar enriquecimento. Eu descobri novos rostos e estabeleci novas relações. Tudo ia bem, sem perder nada da vitalidade da minha velha paróquia.

Mas, infelizmente, isso não durou muito, já que, assim que recuperamos o equilíbrio, as autoridades diocesanas acreditaram ser oportuno voltar à situação anterior: cada um para a sua casa! Depois de três anos de equipes pastorais comuns, as duas paróquias se viam novamente dotadas de um pároco titular.

Assim, de volta à estaca zero, e a obrigação aos paroquianos de voltar para a sua casa própria. O que fizemos, como paroquianos obedientes que somos.

Mas havia uma "falha" que eu não demorei para descobrir. O novo pároco era, na realidade, só um administrador posto ali pelo bispo como líder de uma paróquia que devia fazer uma ampla acolhida aos fiéis praticantes da missa de rito tridentino. O que ele fez admiravelmente, já que vinha das suas fileiras. Assim, depois de cinco anos como padre administrador, ele foi, no ano passado, nomeado pároco titular da paróquia e instalado como tal. E depois, simultaneamente, vimos chegar um segundo vigário da mesma tendência. Assim, dois braços suplementares. Normal, vocês podem pensar, já que agora a paróquia tinha duas comunidades distintas. E, sobretudo, nada de mistura! Todos os domingos e durante as grandes festas litúrgicas, tudo é feito duplamente: duas vigílias de Natal, duas ceias da Quinta-feira Santa, duas vigílias de Páscoa etc. E com a preocupação com os horários, para fazer com que tudo caiba em uma mesma noite.

Alguns poderiam pensar: mas que maravilha! Que performance! Que dinamismo! Que eficiência!

Infelizmente, por trás do ativismo permanente que os nossos dois padres devem enfrentar e ao qual não podem se isentar, porque é a missão que lhes foi atribuída, vemos brotar as "boas velhas tradições". Com o retorno dos cíngulos e das rendas, o vocabulário das homilias se modificou: as crianças devem fazer pequenos sacrifícios durante a Quaresma para agradar ao bom Deus. Os adultos nada mais são do que pecadores que ferem o coração do bom Deus. O pecado da impureza voltou à moda, o santo sacrifício da Missa é o sacrifício propiciatório reiterado todo domingo pela remissão dos pecados, as almas do Purgatório aparecem nas nossas orações, e o inferno está à espreita.

O que dizer da pastoral implementada?

É um retorno às devoções piedosas como a recitação do Rosário, a bênção do Santíssimo Sacramento, a confissão semanal necessária para acolher de coração puro a Santa Eucaristia, as adorações ao Santíssimo Sacramento duas vezes por semana e as procissões ao redor da igreja duas ou três vezes por ano com as vestes pesadas dos hábitos de antigamente...

Devo confessar que a minha docilidade habitual não funciona mais e eu não posso engatar a marcha ré. Abandonei a igreja paroquial e fui me abrigar em uma pequena capela rural onde não há incenso, mas sim belas flores colhidas todos os domingos por uma senhora em seu jardim. Todos aqueles e aquelas que vêm aqui gostam de encontrar a Presença reconfortante do Cristo que se doa. E vão embora contentes, porque têm a certeza de que o amor que receberam é plenitude.

Infelizmente, a homilia que ouvem sempre os incomoda, porque é um dos dois padres que a faz, com as palavras de um outro século.

Assim, uma vez por mês, eu escapo para a paróquia irmã, a que me hospedou nos tempos da fusão e que foi economizada da desconstrução. Quando eu não conseguir mais ouvir pregações devastadoras, eu irei embora definitivamente. Por enquanto, eu espero, porque um ano ainda é um período muito curto para desertar e porque as minhas raízes ainda são profundas.

Eis a história de uma paróquia, a minha, que eu amei porque me formou, me estruturou. E agora eu não reconheço mais a sua linguagem e vejo que ela assume o rosto empoeirado do passado.

Lembro-me do canto do Amado para a sua Vinha:

"Meu amigo possuía uma vinha em fértil colina. Cavou-a, tirou-lhe as pedras e plantou nela videiras de uvas vermelhas. No meio, construiu uma guarita e fez um lagar. Esperava que produzisse uvas boas, mas..." (Isaías 5, 1-3).

Fonte